Companhia dos Aposentados

Tribuna dos Aposentados, Pensionistas e Trabalhadores do Brasil

RADIOGRAFIA DE UM PAÍS INFECTADO





RADIOGRAFIA DE UM PAÍS INFECTADO
                                                                                                                                          Alex Fiúza de Mello

Apesar dos pesares, a pandemia da Covid-19 está oportunizando a todos os brasileiros uma radiografia tangível e atualizada das principais morbidades que ameaçam o organismo político nacional, expondo, com maior clarividência, as medulares lesões que, localizadas nas entranhas do intrincado sistema civil e estatal, há muito debilitam a saúde da sociedade, ameaçando-a de decesso civilizatório.
Na radiografia atualizada, fica evidente:
– que o vírus da corrupção continua altamente contagioso e letal, apresentando, a todo instante, novas e repentinas mutações – como é o caso mais recente do “Coronão” – e demonstrando que ainda se está longe da descoberta de uma vacina definitiva para esse tipo de praga – ao que tudo indica altamente resistente abaixo da linha do Equador;
– que a fragilidade da classe empresarial brasileira diante das inevitáveis endemias cíclicas ainda é patente e preocupante, denotando condições de baixíssima imunidade e alta dependência da “medicação” do Estado, de vez que acostumada à profilaxia artificiosa (e insustentável) do protecionismo, do compadrio e da burla – ao invés de um mais autônomo e emancipado follow up terapêutico, à altura dos desafios contemporâneos radicados na inovação;

– que as ditas “esquerdas” não passam de batota (tapeação), como demonstrou (dentre outros sintomas) a narrativa pequeno-burguesa do “fica em casa” – assimilável, tão somente, pelas bem nutridas e autossuficientes classes média e alta, mas não representativa dos interesses dos segmentos mais pobres e vulneráveis da sociedade (em nome de quem deveriam estar prescrevendo um receituário mais compatível e honesto);
– que a classe política não consegue desvencilhar-se, nem em situações de extrema gravidade (como a do pavoroso quadro de pandemia sanitária), de sua contumaz entropia egocêntrica, insensível aos apelos mais candentes e legítimos da sociedade (a quem deveria servir), ao ponto de recusar, inclusive, destinar parte dos fundos públicos que alimentam as suas sem-vergonhices para fins mais nobres, como o do combate ao coronavírus – exibindo, sem escrúpulos, absoluta mesquinhez, hipocrisia e desfaçatez;
– que alguns governadores e prefeitos, sob o pretexto de “defesa humanitária da vida”, exibiram, sem maiores escrúpulos – numa espécie de “ato falho” incontido –, as suas furtivas verves ditatoriais e totalitárias, retratadas nos abusos cometidos contra a Constituição e os direitos individuais mais fundamentais, durante os polêmicos (e nem sempre justificados) lockdowns;

– que a grande imprensa, matriz histórica (e outrora monopolista) da capciosa práxis das fake News, revelou-se uma desafogada esparrela, escancarada a céu aberto pelos indisfarçáveis arroubos ideológicos e militantes de seus editores e analistas, descompromissados, minimamente, com a decência, a isenção e os compromissos presumidos da ética jornalística – a essa altura ferida de morte pelo descrédito público;

– que a “Justiça” tupiniquim, esculpida na imagem icônica do STF, é outra trampolinice e embuste, sequestrada pelos encontradiços e escusos cambalachos das coxias palacianas, encobertos pelo disfarce simulado e hipócrita das defectíveis capas pretas, ensaiado em ridículas pantomimas plenárias, de estampa circense – com desprezo inescrupuloso à Carta Magna e ao Estado de Direito;
– que as lideranças políticas no comando da embarcação, inebriadas unicamente pelos privilégios de poder, inteiramente engolfadas em seu autismo e mediocridade, não conseguem nem mais disfarçar-se em suas peles de Tartufo, incapazes que são – por deficiência de matriz – de enfrentar os implacáveis maremotos de época (comme il faut) e de conduzir o país a algum porto seguro, com a sinalização de alternativas congruentes e ousadas de rota – como fazem, costumeiramente, os grandes estadistas em contextos de tempestade;

– enfim, que a “democracia” brasileira, ao fim e ao cabo, não passa de uma mera ficção, ademais cinicamente falsificada com indumentária de “república”, iludido o povo por uma Constituição que, apenas na letra da lei (mas nunca na realidade), atribui-lhe o posto de “soberano” – ao invés de desvelar, sem ludíbrios, a sua eterna condenação ao papel servil de simples “legitimador” do poder das consuetudinárias “elites” – na mesma tonalidade dialética da enraizada (e, até aqui, renitente) tradição da “casa grande e senzala”.
Somadas todas essas imagens do “Raio-X”, fica evidente que o país está gravemente enfermo; dilacerado por distúrbios demasiadamente morbosos e tumorações de alcance metastático, a ameaçar, diuturnamente, a sobrevivência do tecido social, e cuja sintomatologia só faz reverberar o célebre diagnóstico de Ayn Rand (romancista e filósofa russa/judia, naturalizada americana), quem, justo há cem anos, já preconizava, em tintas sombrias, a seguinte prognose:
“Quando você percebe que, para produzir, é necessário obter autorização de quem não produz nada; quando você comprova que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando você constata que muitos ficam ricos pelo suborno e pela influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; quando [por fim] você conclui que a corrupção é recompensada e a honestidade se converte em auto sacrifício, então, pode-se afirmar, sem temor de errar, que tal sociedade está [de fato] condenada”.

Decerto, são tempos difíceis e tenebrosos; de insídias e calúnias; de ódio disseminado e de monólogos; em que a racionalidade e o bom senso parecem ter se esvanecido do temerário receituário de momento, seguramente discrepante dos protocolos mais avançados e recomendáveis de tratamento para esse tipo de septicemia incivilizada.
O que conseguiu a “Nova República”, pelo visto, depois de todo o esforço histórico pelas “diretas já”, nada mais foi que a exacerbação dos equivalentes patógenos que sempre permearam a tradicional relação entre Estado e sociedade no Brasil: corrupção, oportunismo, corporativismo, hipocrisia – e demais “infecções virais”. Invariavelmente, as mesmas patologias responsáveis, em última instância, pela condenação do país à “UTI civilizatória”, onde sobrevive como semi-povo, como sub-nação, entubado por respiradores mecânicos fornecidos por “salvadores da pátria” (não importa se de “esquerda” ou de “direita”), enquanto aguarda – sob coma induzido da demagogia e do “(ir)realismo mágico” – por uma “alta” que nunca chega.

Sim, este é, infelizmente, o cruel diagnóstico que emerge do mapeamento radiográfico do país, em toda a sua profundidade e abrangência. Um quadro de enfermidade crônica – e mórbida (!) –, à espera de uma urgente e eficaz terapêutica – sem o descarte da opção cirúrgica mais radical (enquanto há tempo), mesmo que por via dolorosa e sem anestesia.

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