Companhia dos Aposentados

Tribuna dos Aposentados, Pensionistas e Trabalhadores do Brasil

AS MARAVILHAS QUE A VIDA NOS LEGOU

AS MARAVILHAS QUE A VIDA NOS LEGOU No instante fascinante da fecundação começa a contagem progressiva e regressiva do nascer e do morrer de um ser humano na terra, com a sua planilha de vida já estabelecida. Assim, aceitamos a alegria do nascer, mas repudiamos a certeza do morrer. As várias fases da nossa existência neste mundo vão se sucedendo de mãos dadas com o tempo até chegarmos aos 80. A partir daí notamos que o tempo se afastou de nós e passou a correr na nossa frente com uma incrível velocidade “tudo parece que foi ontem”. Como compensar as perdas irreparáveis que a idade traz? Em vez de lutar para não envelhecer também a nossa alma, devemos lutar para não nos entediar. Seguir trabalhando, viajando, lendo, escrevendo, se relacionando, se interessando e se renovando. Porque se desesperarmos, aí sim, não restará mais nada. Destarte, ano após ano, ao festejarmos com sabedoria, mesmo com as nossas sequelas, o final inexorável da jornada, estaremos exercitando a nossa desejada paz de espírito. A própria natureza humana nos conforta para encarar as limitações físicas e emocionais da terceira idade com resignação, para que a nossa vida de idoso seja de calma, alegria e bem estar, dentro dos limites que a longevidade nos outorgou. Não podemos negligenciar as visitas aos médicos, os remédios de uso permanente e os tombos ocasionais. Os nossos músculos não aceitam mais empurrar uma mesa ou levantar um objeto acima das nossas cabeças. Mesmo assim, é normal e indiferente olharmos no espelho o nosso rosto enrugado, os nossos cabelos brancos e os nossos ouvidos surdos e verificar que fomos premiados com mais alguns aninhos de vida. Uma das incertezas dos jovens é pensar na crueza e na limitação da vida, quando se aproximar a terceira idade. Nada mais incorreto. É normal e prazeroso ser idoso. É deitar à sombra, sentindo a aragem da vida amaciar o nosso desgastado corpo. Até os neurônios já combalidos pelo constante uso, ainda conseguem injetar grandes alegrias e qualidade de vida para compensar a perda do vigor físico, já em processo de decadência. Os sonhos se multiplicam, a nossa criatividade ganha dimensões nunca imaginadas, com os valores morais e algumas fantasias compensando a rabugice e outros distúrbios próprios da idade madura. A vida longeva é um manancial de conquistas muitas vezes negadas aos mais jovens em razão da correria destes para vencer na vida. Encaramos com curiosidade, mas com pouca emoção as boas e as más notícias. Nas longas filas dos caixas das lojas, bancos e mercados não fazemos cara feia na exaustiva espera e, até abrindo mão da prioridade aos idosos. Ao atravessarmos uma rua movimentada, ajudados pela bengala ou pela mão de um jovem, o fazemos com a mesma alegria de um cãozinho puxado pela coleira. A morosidade dos movimentos, a visão comprometida e os ouvidos surdos tornam-se uma verdadeira distinção para nos poupar a azáfama de ver e ouvir tolas desventuras deste mundo em ebulição. Os idosos não se importam mais em receber elogios, negar um favor ou emprestar dinheiro, pois não podem mais ser taxados de pedantes, ingratos ou sovinas. Os atropelos da vida moderna não mais os assustam. Os achaques, as doencinhas e os remédios permanentes não lhes causam nenhum transtorno. Os desejos sexuais não os incomodam mais com as suas incertezas, pois o verdadeiro e puro amor atinge o ápice de qualidade nesta esplendorosa fase da vida, com as rugas das nossas companheiras já brotando e a cumplicidade de, ainda, nos aquecer à noite e nos velar durante o dia para aumentar o nosso bem estar. A nossa razão intuitiva nos convida a ler muito, meditar e ter ímpetos literários e narrativos. A única covardia que se fazem aos longevos é a limitação do tempo que ainda lhes restam para apreciar as maravilhas da vida. Do zero aos oitenta os seres humanos ganham anos infindáveis para sobreviverem com garra, merecimento e sonhos. A partir dos oitenta vislumbra-se uma sonegação ingrata dessa preciosa concessão para o idoso curtir os seus desígnios. A ciência precisa intensificar as suas pesquisas para encontrar a chave do tempo, destinada a alargar a faixa da permanência na terra às pessoas da terceira idade, para saborearem as delícias desta bela e doce aventura terrena. José Batista Pinheiro, Cel EB Ref, aos 90 (Rio de Janeiro, 22.04.2021)

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