DIÁRIO DO PODER DE 14/7/2018
PERCIVAL
PUGGINA
As razões da miséria e a
morte do grilo falante
Você sabe por que o Brasil não
consegue solucionar o problema da miséria? Porque, de um lado, deixamos de agir
sobre os fatores que lhe dão causa, e, de outro, nos empenhamos em constranger
e coibir a geração de riqueza sem a qual não há como resolvê-la. Os fanáticos
da política, os profetas de megafone, os “padres de passeata”, para dizer como
Nelson Rodrigues (ao tempo dele não existiam as Romarias da Terra),
escrutinando os fatos com as lentes do marxismo, proclamam que os pobres no
Brasil têm pai e mãe conhecidos: o capitalismo e a ganância dos empresários. Em
outras palavras, a pobreza nacional seria causada justamente por aqueles que
criam riqueza e postos de trabalho em atividades desenvolvidas sob as regras do
mercado.
Estranho, muito estranho. Eu
sempre pensei que as causas da pobreza fossem determinadas por um modelo
institucional todo errado (em 2017, o 109º pior entre 137 países, segundo
o World Economic Forum (WEF). Pelo jeito, enganava-me de novo quando
incluía entre as causas da pobreza uma Educação que prepara semianalfabetos e
nos coloca em 59º lugar no Programa Internacional de Avaliação de Alunos
(PISA), entre 70 países.
Sempre pensei que havia relação
entre pobreza e atraso tecnológico e que nosso país não iria longe enquanto
ocupasse o 55º lugar nesse ranking (WEF, 2017). Na minha santa ignorância,
acreditava que a pobreza que vemos fosse causada, também, por décadas de
desequilíbrio fiscal, gastos públicos descontrolados tomados pela própria
máquina e inflação. Cheguei a atribuir responsabilidades pela existência de
tantos miseráveis à concentração de 40% do PIB nas perdulárias mãos do setor
público (veja só as tolices que me ocorrem!). E acrescento aqui, se não entre
parêntesis, ao menos à boca pequena, que via grandes culpas, também, nessas
prestidigitações que colocam nosso país em 96º lugar entre os 180 do ranking de
percepção da corrupção segundo a Transparência Internacional.
Contemplando, com a minha
incorrigível cegueira, os miseráveis aglomerados humanos deslizantes nas
encostas dos morros, imputava tais tragédias à negligência política. Não via
como obrigatório o abandono sanitário e habitacional dos ambientes urbanos mais
pobres. Aliás, ocupamos a 112ª posição no ranking, entre 200 países, no acesso
a saneamento básico. Pelo viés oposto, quando vou a Brasília, vejo, nos
palácios ali construídos com dinheiro do orçamento da União, luxos e
esplendores de uma corte dos Bourbons.
Mas os profetas do megafone
juram que estou errado. A culpa pela pobreza, garantem, tampouco é do
patrimonialismo, do populismo, dos corporativismos, do culto ao estatismo, dos
múltiplos desestímulos ao emprego formal. Não é sequer de um país que, ocupando
a 10ª posição entre os países mais desiguais do mundo, teve a pachorra de gastar,
sob aplauso nacional, cerca de R$ 70 bilhões para exibir ao mundo sua
irresponsabilidade na Copa de 2014 e nos Jogos Olímpicos de 2016. No entanto,
os Pinóquios da política, das salas de aula, da mídia e dos púlpitos a serviço
da ideologia, fanáticos da irrazão, asseguram-nos que existem pobres por causa
da economia de empresa e dos empreendedores.
Um dos fenômenos brasileiros
deste início de século é o silêncio das consciências ante toda falsidade. É a
morte do grilo falante.
*Este
texto atualiza dados de um pequeno trecho do meu livro “Pombas e Gaviões”,
publicado pela AGE em 2010.
Percival
Puggina, membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e
escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de
jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a
Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo
Pensar+.
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