Notícias sobre fraudes em aposentadoria deixam
servidor em alerta
Ana Paula Ragazzi e Mônica Scaramuzzo14 horas atrás
© Beto Oliveira/Estadão Servidora
Claudia Nunes, de Uberlândia (MG), recorreu a vereadores para tentar evitar prejuízo.
Um esquema que envolve empresas de fachada,
funcionários de prefeituras e gestoras de recursos está colocando em risco a
aposentadoria de servidores municipais em até 200 municípios do Brasil. Alvo de
investigação da Polícia Federal, as fraudes afetam municípios como Uberlândia
(MG), Paulínia (SP) e Campos dos Goytacazes (RJ). Gilmar Machado, ex-prefeito
da cidade mineira, chegou a ser preso na esteira da operação Encilhamento,
deflagrada pela PF em abril.
Pegos de surpresa, servidores afetados temem ser
obrigados a ampliar contribuições para ter o acesso ao benefício que
consideravam garantido. Nessa situação está José Santos, 46 anos, que trabalha
há 23 anos na prefeitura de Uberlândia. Ele soube pelos jornais que o fundo de
pensão que contribui está envolvido em fraude. “Essa história de investimento
podre me preocupou. Foi um choque”, disse. Com renda mensal de R$ 8 mil, Santos
espera que a situação se reverta e não tenha que aumentar a contribuição, de
11% do seu salário.
Também de Uberlândia, a educadora Cláudia Nunes, 36
anos, trabalha para evitar perdas. “Mobilizei um grupo e cobramos dos
vereadores uma solução. A CPI (aberta na Câmara de Vereadores de Uberlândia)
comprovou que havia irregularidades. Quero ver o que vai dar.”
Em alguns casos, os gestores dos fundos de
Previdência nos municípios são suspeitos de participar do esquema. Em outros,
de ter entregado os recursos por incapacidade de avaliar a qualidade das
aplicações.
A Encilhamento aponta movimentação de, no mínimo,
R$ 1,3 bilhão em títulos podres. Mas perdas das instituições de Previdência
podem ultrapassar R$ 15 bilhões, conforme dados de outras operações realizadas
desde 2013 pela PF, apurou o Estado.
Casos. Um dos casos
investigados é o da relação entre as gestoras Incentivo e Gradual. Fontes
próximas às investigações disseram que a Incentivo teria denunciado à PF que,
sem seu conhecimento, a Gradual teria investido R$ 10 milhões de um de seus
fundos com recursos previdenciários municipais na ITS@, empresa do marido da
dona da Gradual, Fernanda de Lima.
A Incentivo teria dito que, além do conflito de
interesses, a ITS@ era inativa e tinha o mesmo endereço da Gradual. A suspeita
da PF é que a Gradual tenha usado o dinheiro para maquiar prejuízos de sua
atividade de corretagem.
Operação semelhante envolveu a capitalização da
ATG, empresa que pretendia lançar uma nova bolsa no Brasil, rival da B3, que
nunca saiu do papel. A ATG foi criada por Arthur Machado, sócio da Bridge
Investimentos, também apontada pela PF como parte no esquema para lesar
previdências municipais.
O outro sócio da Bridge é José Carlos Oliveira, que
comandou o BNY Mellon no Brasil por 15 anos, até 2013, quando foi desligado
pelo banco. Machado e Oliveira já foram detidos em outras operações da PF
relacionadas a fundos de pensão.
A Gradual, segundo as investigações, também teria
usado dinheiro de aposentadorias para pagar uma dívida com a Bridge. Em 2015, a
Bridge anunciou a compra da Gradual, mas desistiu do negócio. A Encilhamento
aponta ainda que outra empresa possivelmente ligada à Gradual, a OAK, seria o
novo nome da Solo, que cuidava do FIP Viaja Brasil, do doleiro Alberto Youssef,
pivô da Lava Jato.
Ao identificar uma repetição dos atores envolvidos,
a PF passou a apurar uma rede de desvio de recursos. E concluiu que a figura
central, que faz a ponte entre os municípios e os gestores, seria Renato DeMatteo,
hoje foragido. Ele é dono da gestora FMD, que chegou a gerir R$ 590 milhões em
recursos dos RPPS. As investigações apontam que ele tinha contatos para acessar
os responsáveis pelas aposentadorias de municípios e convencê-los a fazer
investimentos arriscados..
Outro lado. A Gradual não
quis dar entrevista. Fontes próximas à empresa, porém, dizem que a Incentivo
concordou com a compra das debêntures da ITS@, mas teria pedido comissão em
troca, que ela teria se recusado a pagar.
Procurada, a Incentivo não quis comentar, pois as
investigações sobre o pedido de inquérito feito por ela em 2016 estão em curso.
A PF deve investigar todas as acusações, apurou o Estado, embora a Encilhamento
não tenha apontado irregularidades da Incentivo. A Bridge não quis se
manifestar. A defesa de Machado nega as acusações. Renato de Matteo não foi
encontrado. A PF não deu entrevista.
Em nota, Gilmar Machado, ex-prefeito de Uberlândia,
disse que todas as aplicações foram feitas pelo gestor da época e fiscalizadas
pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
0 comentários:
Postar um comentário